Dentro de mim existe um lugar onde vivo inteiramente só
e é lá que se renovam as nascentes que nunca secam.
P.Buch

9 de fevereiro de 2013

Comunicação

Daí fui comprar um Ipad. Quero usá-lo nas minhas aulas. Fui à loja da Apple no Iguatemi, pois queria saber tudo o que ele poderia fazer e se iria mesmo me ajudar em minhas aulas. O atendente estava ocupado e dois garotos estavam nos únicos dois aparelhos que funcionavam no mostruário, o que me impossibilitava ter um primeiro contato com essas maquininhas. Como os garotos não desgrudavam deles, pedi para dar uma olhadinha. “Claro, claro”, disse um deles. E eu então comecei a tatear aquele novo mistério. Eu fazia algumas perguntas ao Ed e como ele também não sabia, o garoto começou a responder e com tal desenvoltura que esqueci do atendente. De repente olhei para aquele garotinho e disse, “By the way, você trabalha aqui?” O que ele respondeu prontamente: “Não, mas é o meu sonho”. Olhei novamente para ele, pensando que talvez tivesse uns 12 anos e tinha, com essa idade, um sonho a meu ver, um tanto estranho, mas que poderia se tornar realidade naquela hora mesmo, tamanho seu entusiasmo. Comprei o aparelho. Sim, se eu tivesse ainda alguma dúvida se deveria adquiri-lo ou não, naquele momento descobri que estava totalmente convencida que não poderia mais viver sem um aparelhinho daquele.
 
Não faz muito tempo eu usava um minigravador de fitas cassetes onde, toda noite, tinha de botar no ponto as as fitas para dar aula a cada aluno do dia seguinte. Saía para a aula com minha bolsa cheia de fitas cassetes. Quando o gravador quebrou há uns 3 anos, fiquei desesperada e sai para comprar um novo. Levei o meu porque queria comprar um igualzinho. Fui em todas as lojas de Campinas, procurei pela Internet e nada. Não queria desistir e fui a uma última loja. Mostrei o gravador para o vendedor da loja que deveria ter uns 22 anos. Ele pegou meu gravador, olhou, olhou, virou e perguntou: “O que e isso?”. “Deixa pra lá”, respondi, peguei aquele “museu” e voltei pra casa não sabendo o que fazer.

Mas acabei encontrando outro gravador, não aqui, mas em Buenos Aires, numa noite, quando passeávamos pela Calle Florida. Usei-o mais um ou dois anos e depois descobri que eu poderia botar todas as minhas fitas cassetes num celular e dar aulas com ele. E não é que funcionou? Adorei. Não precisa mais botar as fitas no ponto para as aulas do dia seguinte. E ficava imaginando como que tudo aquilo podia estar dentro de um celular, ao mesmo tempo em que me lembrava que, quando trabalhei na 3M, o computador de lá era mais ou menos do tamanho de meu apartamento. E que eu já achava o máximo aqueles primeiro PCs de tela verde.

Como o som do celular não era lá muito bom, resolvi comprar o tal do iPad. Dizem que esse aparelho é muito “intuitivo”... e é mesmo, pois tenho descoberto muitas outras coisas. O mais sensacional foi saber que todas as informações poderiam ser guardadas nas “nuvens”. Nas nuvens? O meu medo agora é saber se essas nuvens estarão sempre lá ou se elas se transformarão em chuva e eu posso perder tudo o que uso nas aulas... Bom, uma coisa boa é que não preciso mais ensinar para meus alunos o que a palavra “cloud” significa. Todos já sabem, principalmente os mais novos.

E por aí vai... São histórias e mais histórias que se misturam trazendo o passado e me levando a pensar como será então o futuro, com toda essa tecnologia e como lidamos com tudo isso, no presente, dentro de nós.

Estava, dias desses, perdida nesses pensamentos quando um aluno chegou à aula com uma camiseta onde estava escrito uma frase tirada, talvez, da música dos Titãs: “E você tem fome do quê?” Eu fiquei pensando nessa pergunta que me impulsionava a pensar no computador do tamanho de meu apartamento e no toca fitas e no PC de tela verde e no celular e no Ipad e em todas as facilidades de comunicação. Sim, porque todos os avanços tecnológicos nos garantem novos meios de comunicação, mas não nos dão garantia alguma de uma comunicação de qualidade. 

Para conseguir isso temos de trilhar caminhos mais sutis. Não, não precisamos subir às nuvens para isso. O caminho é para dentro de nós mesmos a fim de nos conhecermos mais; de saber como lidamos com nossas frustrações, nossos quereres, nossos prazeres; em que momento a raiva, a paixão e o amor são deflagrados para que a minha comunicação saia sem ruídos emocionais; para que eu ouça aquilo que eu falo; para que não agrida ninguém com a desculpa de estabelecer verdades.  

Ao contrário da busca de coisas que valham a pena ter,
a busca de coisas que valham a pena ser,
geralmente exige longos períodos de solidão.
(Meyer Fridman)